Xul Solar e o Universo Pré-Colombiano: Sua "Viagem à Semente"
O curador da grande exposição "Antes da América" em Madri conta como Xul Solar iniciou sua busca estética pela arte indígena latino-americana.
Entre outras referências mitológicas, o artista vivenciou um intenso período americanista, coincidindo com a Primeira Guerra Mundial.
A celebração do Centenário da Independência em todo o continente desencadeou uma busca por raízes locais em muitos artistas.
Na exposição "Antes da América. Fontes Nativas na Cultura Moderna" (Fundação Juan March, Madri, outubro de 2023 a março de 2024), incluímos três obras de Xul Solar: "Tapeçaria", "Rinde" e "Mandalas". Na seleção de obras para esta exposição, pautamo-nos, entre outros objetivos, pela apresentação de obras de artistas com um histórico sustentado de influência artística pré-colombiana, mas também por aqueles que — como Xul Solar — demonstraram admiração por essas correntes e capturaram essa influência em algumas de suas obras.
Isso também nos deu a oportunidade de observar Xul sob uma perspectiva diferente, colocando essas obras em diálogo com as de outros artistas do continente que sentiam a mesma atração pelo passado americano.
Xul Solar é um artista versátil e multifacetado — estudos como os conduzidos pela pesquisadora Patricia Artundo, entre outros, atestam isso — um artista significativamente moderno que soube encontrar nas fontes originais americanas caminhos específicos para resolver a eterna obsessão representada pela busca de uma identidade cultural para o continente. Essa práxis "americanista" integra-se aos estudos que Xul Solar realizou sobre outras civilizações antigas em todo o mundo.
A inclusão, em suas iconografias distintivas, de abstrações geométricas (o caso de "Tapeçaria" é relevante nesse sentido, razão pela qual o solicitamos para "Antes da América"), máscaras, animais sagrados como cobras, divindades e outros elementos evocativos de civilizações antigas nos falam dessa civilização.
Não é à toa que as obras de Xul Solar, nessa linha americanista, concentram-se particularmente no período de 1915 a 1930. Foram anos em que as comemorações do Centenário e as consequentes avaliações culturais, após um século de emancipação política do continente, levaram a um olhar introspectivo mais profundo, com especial atenção ao passado.
Essa "viagem à semente" (como diria o romancista cubano Alejo Carpentier) se acentuaria na época da Primeira Guerra Mundial, que marcaria a crise do até então intocável modelo cultural europeu.
No mundo das artes, o crescimento experimentado pelas escolas de artes e ofícios e pelas chamadas "artes aplicadas" (têxteis, cerâmica, mobiliário, design gráfico, cenografia, entre outras disciplinas) levou, na Argentina, à celebração do Primeiro Salão Nacional de Artes Decorativas em 1918, com uma participação significativa e distinta de artistas contemporâneos.
Se considerarmos as datas, obras como as já mencionadas "Tapeçaria" (1918) e "Rinde" (1919) — esta última representando um pequeno vaso com uma figura humana geométrica sob o sol ao centro e uma composição puramente abstrata na base — poderiam ser compreendidas dentro desse novo espírito da época, marcado pela construção de uma modernidade com raízes próprias.
Rodrigo Gutiérrez Viñuales é historiador da arte. Foi curador da exposição "Antes da América. Fontes Originais da Cultura Moderna" na Fundación March, Madri 2023. É professor da Universidade de Granada. É membro da Academia Nacional de História e da Academia Nacional de Belas Artes (Argentina).
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